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– Quinta-feira – repete McMurphy.

– Luuuuu – berra o cara lá em cima.

– É o Rawler – diz Scanlon, olhando para o teto. Ele não quer prestar atenção a McMurphy. – Rawler, o Berrador. Ele passou por esta enfermaria há uns anos. Não ficava quieto de maneira que agradasse a Srta. Ratched, se lembra, Billy? Luu luu luu, o tempo todo, a um ponto que pensei que eu fosse ficar maluco. O que eles deviam fazer com todo aquele bando de malucos lá de cima é jogar umas duas granadas no dormitório. Eles não têm nenhuma utilidade para ninguém…

– E amanhã é sexta-feira – diz McMurphy. Ele não deixa Scanlon mudar de assunto.

– Sim – diz Cheswick, fazendo uma carranca. -

Amanhã é sexta-feira.

Harding vira a página da sua revista.

– E com isso fará quase uma semana que o nosso amigo McMurphy está conosco sem ter derrubado o governo, é isso o que você está dizendo Cheswick? Deus, pensar no abismo de apatia no qual caímos… uma vergonha, uma vergonha lamentável.

– Pro inferno com essa história – diz McMurphy. – O que Cheswick quer dizer é que o primeiro jogo do torneio vai ser disputado e transmitido pela TV amanhã, e o que é que nós vamos estar fazendo? Vamos estar esfregando mais uma vez essa porcaria desse berçário.

– É isso – diz Cheswick. – O Berçário Terapêutico da Mamãezinha Ratched.

Encostado na parede da sala eu começo a me sentir como um espião; o cabo da vassoura nas minhas mãos é feito de metal, em vez de madeira (o metal é melhor condutor) e é oco; há lugar de sobra lá dentro para esconder um microfone miniatura. Se a Chefona estiver ouvindo isso, ela realmente vai negar o Cheswick. Apanho uma bola dura de chiclete do meu bolso e retiro uns fiapos que estão grudados nela, coloco-a na boca e deixo ficar até amolecer.

– Deixe-me ver de novo – diz McMurphy. – Quantos de vocês aí votariam comigo se eu tornasse a propor aquela mudança de horário?

Cerca de metade dos Agudos balança a cabeça dizendo sim, muito mais do que os que realmente votariam. Ele repõe o gorro na cabeça e apóia o queixo nas mãos.

– Vou contar uma coisa para vocês, pois, eu não consigo entender. Harding, que é que há de errado com você, para sair correndo da raia? Está com medo de que se você levantar a mão aquela velha escrota vá cortá-la fora.

Harding ergue uma sobrancelha fina.

– Talvez eu esteja, talvez eu tenha medo de que ela vá cortá-la fora se eu a levantar.

– E você, Billy? É disso que você está com medo?

– Não. Não acho que ela vá f-f-fazer coisa nenhuma, mas… – ele encolhe os ombros e suspira e sobe pelo grande painel de torneiras que controla os bocais dos chuveiros, fica empoleirado lá em cima como um macaco -… mas eu não acho que uma votação a-a-a-adiantaria nada. Não a l-longo prazo. Simplesmente não adianta, M-Mack.

– Não adianta nada? Porra! Vai fazer um bocado de bem a vocês aí apenas o exercício de levantar o braço.

– Ainda assim é um risco, amigo. Ela tem sempre a capacidade de tornar as coisas piores para nós. Um jogo de beisebol não vale o risco – diz Harding.

– Porra, quem foi que disse que não? Cristo, eu não perco um Campeonato Mundial há anos. Mesmo quando eu estava na cadeia num mês de setembro, eles nos deixaram trazer uma TV e assistir aos jogos; eles teriam tido um belo motim nas mãos se não tivessem deixado. Talvez eu tenha que pôr aquela maldita porta abaixo e ir andando até algum bar no centro para assistir ao jogo, só eu e o meu companheiro Cheswick.

– Ora, aí está uma sugestão de muito mérito – diz Harding atirando a revista. – Por que não apresentar isso para uma votação na Sessão de Grupo amanhã? "Srta. Ratched, eu gostaria de apresentar uma moção para que a enfermaria seja transportada em massa para o Hora Vaga, para tomar cerveja e ver televisão."

– Eu apoiaria a moção – diz Cheswick. – Sem tirar nem pôr.

– Pro inferno com esse negócio de massa – diz McMurphy. – Estou cansado de olhar pra vocês, bando de velhinhas; quando eu e Cheswick dermos o fora daqui acho que, por Deus, vou fechar a porta a pregos quando sair. Vocês, aí, é melhor ficarem por aqui; a mamãezinha de vocês provavelmente não deixaria vocês atravessarem a rua.

– Ah, é? É isso, é? – Fredrickson se levantou e se aproximou por trás de McMurphy. – Você vai simplesmente levantar uma dessas suas botonas de machão e derrubar a porta com um pontapé? É um cara duro, realmente.

McMurphy quase que nem olha para Fredrickson; aprendeu que Fredrickson pode agir de maneira meio explosiva de vez em quando, mas é uma encenação que termina diante da mais leve ameaça.

– Então como é que é, valentão – continua Fredrickson. – Você vai derrubar a porta a pontapés e nos mostrar o quanto você é duro?

– Não, Fred, acho que não. Eu não gostaria de arranhar a minha bota.

– Ah, é? O.K. Você está botando tanta banca, conta direitinho como é que você iria dar o fora daqui?

McMurphy olha em volta.

– Bem; acho que eu poderia arrebentar a tela de uma dessas janelas com uma cadeira quando e se me desse na telha…

– Ah, é? Você poderia, poderia? Arrebentar direto? O.K.! Vamos ver você tentar. Vam'bora, valentão, aposto 10 dólares como você não consegue.

– Nem se incomode em tentar, Mack – diz Cheswick. – Fredrickson sabe que você vai apenas quebrar uma cadeira e acabar na Enfermaria dos Perturbados. No primeiro dia em que chegamos aqui, nos deram uma demonstração sobre essas telas. São feitas de maneira especial. Um técnico pegou uma cadeira igualzinha a essa em que estão os seus pés e deu com ela na tela até que a cadeira não passasse de madeira estraçalhada. Quase que nem arranhou a tela.

– Então está bem – diz McMurphy, olhando em volta. Posso ver que ele está ficando mais interessado. Espero que a Chefona não esteja ouvindo isso; ele vai parar na Enfermaria dos Perturbados em uma hora. – Precisamos de uma coisa mais pesada. Que tal uma mesa?

– A mesma coisa que a cadeira. É da mesma madeira, do mesmo peso.

– Está bem, por Deus, então vamos descobrir o que é que eu teria de atirar por aquela tela para arrebentá-la. E se vocês não acreditam que eu seria capaz de fazê-lo, se tivesse necessidade, então é melhor pensarem de novo. O.K… alguma coisa maior que uma mesa ou uma cadeira… Bem, se fosse de noite eu poderia atirar aquele vaso gordo; ele é bastante pesado.

– Macio demais – diz Harding. – Bateria na tela e ela o cortaria em quadradinhos como uma berinjela.

– Que tal uma das camas?

– Uma cama é grande demais, ainda que você conseguisse levantá-la. Não passaria pela janela.

– É claro que eu conseguiria levantá-la. Bem, que diabo, bem aí onde você está: aquela coisa em que Billy está sentado. Aquele grande painel de controles com todas as manivelas e alças. Isso é bastante duro, não é? E, porra, deve ser suficientemente pesado.

– Claro – diz Fredrickson. – Isso é a mesma coisa que você derrubar a porta de aço da frente a pontapés.

– Que é que há de errado em usar o painel? Não parece estar pregado no chão.

– Não, não está aparafusado… provavelmente nada tem que o segure exceto uns poucos fios de arame… mas olhe para ele, por Deus.

Todo mundo olha. O painel é de aço e cimento, da metade do tamanho de uma das mesas, provavelmente pesa duzentos quilos.

– O.K., estou olhando para ele. Não parece nada maior que os fardos de feno que já carreguei para dentro de caminhões.

– Temo, meu amigo, que este aparelho vá pesar um pouco mais do que os seus fardos de feno.

– Cerca de mais um quarto de tonelada, aposto – diz Fredrickson.

– Ele tem razão, Marck – diz Cheswick. – Deve ser terrivelmente pesado.

– Droga, será que vocês aí estão me dizendo que não consigo levantar aquela tralhazinha insignificante?

– Meu amigo, não me lembro de nada a respeito de psicopatas serem capazes de mover montanhas, além das suas outras aptidões dignas de menção.

– O.K.! Você diz que eu não consigo levantá-lo. Bem, por Deus…

McMurphy salta da mesa e começa a tirar o paletó verde; as tatuagens, surgindo fora das mangas da camiseta, saltam nos músculos de seus braços.

– Então quem está disposto a apostar cinco mangos? Ninguém vai me convencer de que não sou capaz de fazer uma coisa até que eu tenha pelo menos tentado fazê-lo. Cinco mangos.

– McMurphy, isto é tão idiota como a sua aposta sobre a enfermeira.

– Quem tem cinco mangos que queira perder? É pegar ou largar…

Todos começam a assinar vales imediatamente. Ele os venceu tantas vezes no pôquer e no vinte-e-um que eles não tinham esperança de ir à forra, mas esta é uma boa oportunidade. Não sei qual o objetivo dele; mesmo grande e forte como é, seriam precisos três dele para levantar aquele painel, e ele sabe disso. Basta-lhe apenas olhar para a coisa e vê que provavelmente não conseguiria movê-la, quanto mais levantá-la. Só mesmo um gigante para tirá-la do chão. Mas quando os Agudos estão com todos os vales assinados, ele se adianta para o Dainel, tira Billy Bibbit de lá de cima e cospe nas grandes palmas das mãos calejadas, bate palmas, movimenta os ombros.

– O.K., saiam do caminho. Às vezes, quando me vou exercitar, uso todo o ar das redondezas e homens adultos desmaiam de sufocação. Cheguem para trás. Há uma possibilidade de cimento estilhaçar-se e aço voar. Levem as mulheres e as crianças para algum lugar seguro. Para trás…

– Por Deus, ele bem que é capaz de fazê-lo – resmunga Cheswick.

– Claro, talvez ele consiga convencê-lo a sair do chão só com um papo – diz Fredrickson.

– É mais provável que ele adquira uma bela hérnia – comenta Harding. – Ora, vamos, McMurphy, pare de agir como um idiota; não existe um homem que seja capaz de levantar esse negócio.

– Para trás, mariquinhas, vocês estão utilizando o meu oxigênio.

McMurphy se balanceia nos pés algumas vezes para obter uma boa base, esfrega as palmas das mãos nas coxas, em seguida se abaixa e segura as alavancas dos lados do painel. Quando começa a fazer força, todos se põem a vaiá-lo e a ridicularizá-lo. Ele solta, levanta-se e torna a ajeitar os pés.

– Desistindo? – Fredrickson sorri.

– Apenas me aquecendo. Aqui vai a força de verdade… – e torna a agarrar as alavancas.

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