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– Que é que há a respeito de cigarros, Srta. Ratched? Não creio que tenha tomado conhecimento…

– Doutor, eu acho que três, quatro e às vezes cinco maços de cigarros por dia são absolutamente demais para um homem fumar. Foi isto que pareceu estar acontecendo na semana passada, depois da chegada do Sr. McMurphy, e foi por isso que eu achei que talvez fosse melhor apreender os pacotes que os homens compram na cantina e distribuir apenas um maço por dia para cada homem.

McMurphy inclinou-se para a frente e cochichou alto para Cheswick:

– Vai ouvir dizer que a próxima decisão dela será a respeito das idas à latrina; não apenas um cara tem de levar sete companheiros para o banheiro junto com ele, mas também está limitado a duas idas por dia, que vão acontecer quando ela disser que pode.

E tornou a se recostar na cadeira e riu tanto que mais ninguém pôde dizer coisa alguma durante quase um minuto.

McMurphy se estava divertindo um bocado com o tumulto todo que estava criando, e acho que fiquei um pouco surpreendido porque ele não estava sendo alvo, também, de muita pressão do pessoal, especialmente surpreendido de que a Chefona não tivesse mais nada a lhe dizer senão o que lhe dizia. "Eu pensei que aquela velha escrota fosse mais dura na queda do que está sendo", disse ele a Harding depois de uma sessão. "Talvez tudo de que ela precisasse para endireitá-la fosse uma boa derrubada. O negócio é que – ele franziu o cenho – ela age como se ainda estivesse com todas as cartas escondidas naquela sua manga branca."

Ele continuou divertindo-se com aquilo, até mais ou menos quarta-feira da semana seguinte. Então descobriu por que a Chefona estava tão segura do seu jogo. Quarta-feira é o dia em que eles carregam todo mundo que não tem nenhum tipo de doença e levam para a piscina, quer a gente queira quer não. Quando a neblina estava ligada na enfermaria, eu costumava esconder-me nela para não ir. A piscina sempre me assustou; eu sempre tive medo de que fosse entrar e perder o pé e me afogar, ser sugado pelo encanamento abaixo e ser lançado no mar. Eu costumava ser um bocado corajoso na água, quando menino, em Columbia; andava pelo andaime em volta da cachoeira, com todos os outros homens, com dificuldade, com a água rugindo numa torrente verde e branca a minha volta, e a névoa fazendo arco-íris, sem nem ao menos ter sapatos de tachas como os outros homens. Mas, quando vi papai começar a ficar com medo das coisas, também fiquei com medo, fiquei de tal maneira que não podia suportar nem um laguinho raso.

Nós saímos do ginásio e a piscina estava ondulante, cheia de homens nus; a algazarra e a gritaria ecoavam no teto alto, como sempre acontece em piscinas cobertas. Os crioulos nos levaram lá para dentro. A água estava morna, agradável, mas eu não queria afastar-me da borda (os crioulos andam pela borda com longos bastões de bambu para afastar da beirada quem tenta agarrar-se nela). Assim, fiquei perto de McMurphy, porque eu sabia que eles não tentariam fazê-lo ir para o fundo se ele não quisesse.

Ele conversava com o salva-vidas, eu fiquei de pé a pouca distância. McMurphy devia estar num buraco porque tinha de agitar as pernas para flutuar, enquanto eu apoiava os pés no fundo. O salva-vidas estava de pé na borda da piscina; tinha um apito e vestia uma camiseta com o número de sua enfermaria impresso. Ele e McMurphy trocavam idéias a respeito da diferença entre o hospital e a cadeia; e McMurphy comentava como o hospital era muito melhor. O salva-vidas não tinha certeza. Eu o ouvi dizer a McMurphy que, para começar, ser internado não é como ser sentenciado.

– Você é condenado e sentenciado à prisão, e você tem uma data à sua frente, quando sabe que vai ser solto – disse ele.

McMurphy parou de espadanar na água como vinha fazendo. Nadou devagar até a borda da piscina e se segurou ali, olhando para o salva-vidas.

– E se você for internado? – perguntou depois de uma pausa.

O salva-vidas levantou os ombros num movimento e deu um puxão no apito pendurado no pescoço. Era antigo jogador profissional de futebol, com marcas na testa, e sempre que saía da sua enfermaria um emissor se ligava atrás de seus olhos e seus lábios começavam a cuspir números e ele caía de gatinhas na posição de um jogador pronto para um ataque e saltava em cima de uma enfermeira qualquer que passasse, metia o ombro no traseiro dela, bem a tempo de deixar o médico passar correndo pelo espaço atrás dele. Era por isso que ele estava lá em cima na Enfermaria dos Perturbados; sempre que não estava trabalhando como salva-vidas era capaz de fazer alguma coisa assim.

Ele tornou a encolher os ombros para a pergunta de McMurphy, olhou em seguida para trás e para a frente, para ver se algum crioulo estava por perto, e se ajoelhou perto da borda da piscina. Estendeu o braço para que McMurphy olhasse.

– Está vendo este gesso?

McMurphy olhou para o braço grande do outro.

– Você não tem gesso nenhum nesse braço, companheiro.

O salva-vidas sorriu.

– Bem, esse gesso está aí porque eu tive fratura feia no último jogo com os Castanhos. Não posso voltar ao campo até que a fratura se consolide e eu tire o gesso. A enfermeira diz que está curando meu braço em segredo. É, cara, ela diz que se eu tomar cuidado com este braço, não forçá-lo, ela vai tirar o gesso e eu vou poder voltar a jogar bola com o time.

Ele apoiou os punhos fechados no ladrilho molhado, colocou-se numa posição de jogo de três pontos para testar o braço. McMurphy o observou por um minuto e então perguntou-lhe há quanto tempo ele esperava que o braço ficasse bom para que pudesse sair do hospital. O salva-vidas levantou-se devagar e esfregou o braço. Agiu como se estivesse magoado por McMurphy ter perguntado aquilo, como se tivesse sido acusado de ser fraco e ficar lambendo as feridas.

– Estou internado – disse ele. – Já teria saído daqui antes, se fosse por mim. Talvez não pudesse jogar no primeiro time, com este braço ruim, mas poderia ficar dobrando toalhas, não poderia? Poderia fazer alguma coisa. Aquela enfermeira da minha ala fica dizendo para o médico que não estou pronto. Nem mesmo para dobrar toalhas naquela porcaria daquele vestiário. Não estou pronto.

Virou-se e foi andando até a cadeira como um gorila drogado, e olhou para baixo, para nós, o lábio inferior estendido para fora.

– Fui apanhado por embriaguês e desordem, e estou aqui há oito anos e oito meses – disse ele.

McMurphy afastou-se da borda da piscina e foi flutuando, agitando as pernas, e ficou pensando a respeito daquilo: ele havia sido condenado a uma pena de seis meses na colônia penal, com dois meses já cumpridos, faltando cumprir mais quatro – e quatro meses era o máximo que queria ficar trancado em qualquer lugar. Já estava há quase um mês naquele hospício e bem que podia ser muito melhor do que uma colônia penal, com boas camas e suco de laranja no café da manhã, mas não era tão melhor a ponto de fazer com que quisesse passar dois anos ali.

Nadou até os degraus na extremidade rasa da piscina e sentou-se ali durante o resto do tempo, puxando aquele pequeno tufo de pêlos vermelhos no pescoço e franzindo o cenho. Observando-o sentado ali, concentrado em si mesmo, lembrei-me do que a Chefona dissera durante a reunião, e comecei a sentir medo.

Quando soou o apito para que saíssemos da piscina e todos nós fomos em fila para o vestiário, encontramos o pessoal de uma outra enfermaria, que vinha para seu período de piscina, e na bacia de lavar os pés no chuveiro, por onde se tinha de passar, estava o tal garoto da outra enfermaria. Ele tinha a cabeça grande e esponjosa e quadris e pernas estufados – como se alguém agarrasse um balão de gás cheio de água e o apertasse no meio – e estava deitado de lado na bacia de lavar pés; fazia ruídos como uma foca sonolenta. Cheswick e Harding o ajudaram a ficar de pé, mas ele tornou a se deitar na bacia. A cabeça balançava-se no desinfetante. McMurphy os observou levantarem-no de novo.

– Que diabo é que ele é? – perguntou.

– Ele tem hidrocefalia – disse-lhe Harding. – Uma espécie qualquer de distúrbio linfático, acho. A cabeça se enche de líquido. Dê uma mãozinha aqui para levantá-lo.

Eles soltaram o garoto, e ele tornou a deitar-se na bacia de lavar os pés; a expressão de seu rosto era paciente, indefesa e obstinada; a boca se inflou e soprou bolhas na água leitosa. Harding repetiu seu pedido a McMurphy, para que lhes desse uma ajuda, e ele e Cheswick se inclinaram para o garoto. McMurphy os afastou, passou por eles, saltou por cima do garoto e entrou no chuveiro.

– Deixem que ele fique aí – disse enquanto se lavava no chuveiro. – Vai ver que ele não gosta de água funda.

Eu podia prever o que estava por vir. No dia seguinte ele surpreendeu todo mundo: acordou cedo e limpou o banheiro até que brilhasse, e em seguida foi trabalhar no assoalho do corredor quando os crioulos lhe pediram para ir. Surpreendeu todo mundo, menos a Chefona: ela agiu como se aquilo não fosse de modo algum surpreendente.

E naquela tarde, na sessão, quando Cheswick disse que todo mundo havia concordado em que devia haver uma solução definitiva qualquer sobre o caso dos cigarros, dizendo "não sou nenhuma criança para que me controlem os cigarros como doces! Queremos que se faça alguma coisa a respeito disso, não está certo, Mack?" e esperando que McMurphy o apoiasse, tudo que obteve foi silêncio.

Olhou para o canto de McMurphy. Todo mundo olhou. McMurphy estava lá, examinando o baralho de cartas que deslizava, sumindo e aparecendo em suas mãos. Ele nem ergueu o olhar. Fez-se um terrível silêncio; só se ouviam o bater das cartas engorduradas e a respiração pesada de Cheswick.

– Quero que se faça alguma coisa! – Cheswick gritou de novo, de repente. – Não sou nenhuma criacinha! – Ele bateu com o pé e olhou em volta de si como se estivesse perdido e fosse começar a chorar a qualquer minuto. Cerrou os punhos e os apertou contra o tórax gordo e arredondado. Os punhos formavam pequenas bolhas rosadas contra o verde do pijama, e estavam cerrados com tanta força que ele tremia.

Ele nunca havia parecido grande; era baixo e gordo demais, e tinha uma área careca na parte de trás da cabeça que ficava à mostra como um dólar cor-de-rosa, e de pé ali, sozinho, no meio da enfermaria, daquele jeito, ele parecia minúsculo. Olhou para McMurphy e não recebeu sequer um olhar de volta, e foi olhando para a fileira de Agudos, procurando ajuda. Cada vez que um homem desviava o olhar e se recusava a responder, o pânico aumentava em seu rosto. Seu olhar finalmente se deteve na Chefona. Ele bateu o pé mais uma vez.

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