Литмир - Электронная Библиотека

– Ora veja, o que é isto? – diz Totó. – Olhe como brilha esta pedrinha.

– Lave bem ela, meu chapa.

E ele me passa a pedra. É um pequeno cristal do tamanho de um grão-de-bico. Depois de lavado, brilha ainda mais no lado em que a sua ganga está quebrada, pois a pedra está recoberta por uma espécie de casca de arenito muito dura.

– Será que não é um diamante?

– Cale essa boca, Totó. Não é hora de falar, se for um brilhante. Você já pensou se a gente tivesse a sorte de encontrar uma mina de diamantes? Vamos esperar até de noite e esconderei esse troço.

À noite, estou dando lições de matemática a um cabo (hoje coronel, que se prepara para o exame de oficialato. Esse homem, dotado de nobreza de alma e retidão a toda prova (que me demonstrou durante mais de 25 anos de amizade), é agora o Coronel Francisco Bolagno Utrera.

– Chico, o que é isto? É um cristal de rocha?

– Não – diz ele, após examinar minuciosamente a pedra. – É um diamante. Esconda bem e não deixe ninguém ver. Onde foi que você encontrou?

– Na minha plantação de tomates.

– Isso é meio esquisito. Será que você não o pegou quando tirava água do rio? Você não arrasta o balde e tira um pouco de areia com a água?

– Justamente, é o que acontece.

– Então é isso. Você tirou do rio Caroni esse brilhante. Você pode procurar, mas preste atenção para ver se não pegou outras pedrinhas, porque a gente nunca encontra uma pedra preciosa isolada. Onde se encontra uma, é garantido que há outras mais.

Totó se põe a trabalhar com afinco.

Nunca trabalhou tanto em sua vida. Os nossos dois companheiros, a quem nada havíamos contado, diziam para ele:

– Pára de trabalhar, Totó! Você quer se rebentar, trazendo tantos baldes de água do rio! E você ainda traz areia com a água!

– É para que a terra fique mais leve, meu chapa – respondia Totó. – Misturando com areia, ela filtra melhor a água.

Totó, apesar das brincadeiras de nós todos, continua a carregar baldes de água sem parar. Certa vez, era meio-dia, ele tropeça e se esparrama diante de nós que estamos sentados na sombra. E, no meio da areia derramada, aparece uma pedra com duas vezes o tamanho de um grão-de-bico. A ganga, mais uma vez, está quebrada; se não fosse isso, não se veria a pedra. Mas Totó se trai, escondendo a pedra muito depressa.

– Ora, ora – diz Deplanque, será que não é um diamante? Uns soldados me disseram que esse rio tem muito ouro e diamantes.

– É por isso que eu carrego tanta água! Vocês vêem que não sou tão cretino como vocês pensam! – diz Totó, satisfeito de poder finalmente explicar por que motivo ele trabalha tanto.

Encurtando a história, em seis meses Totó reúne de 7 a 8 quilates de brilhantes. Quanto a mim, tenho uma dúzia deles, além de mais de trinta pedrinhas menores, e o negócio está-se tornando “comercial”, segundo a gíria dos mineradores. E um belo dia encontro uma pedra de mais de 6 quilates, a qual, lapidada mais tarde em Caracas, rendeu mais ou menos 4 quilates. Essa pedra está ainda comigo e eu a trago sempre no dedo, nunca a tiro. Deplanque e Antartaglia também conseguiram juntar algumas pedras preciosas. Ainda estou de posse do canudo que usava na penitenciária e coloquei as pedras dentro dele. Também os meus companheiros fabricaram umas imitações de canudos em chifre de boi, dentro dos quais eles guardam suas pequenas fortunas.

As autoridades não sabem de nada, salvo o futuro coronel, o cabo Francisco Bolagno. Os tomates e as outras plantas cresceram. Os oficiais pagam escrupulosamente pelos legumes que levamos todos os dias à sua mesa.

Gozamos de relativa liberdade. Trabalhamos sem qualquer vigilante e dormimos em nossas duas casinhas. Nunca mais vamos para o campo de trabalho. Somos respeitados e bem tratados. Naturalmente, sempre que se apresenta a oportunidade, insistimos com o diretor para que nos ponha em liberdade. Cada vez, ele responde “logo mais”, porém já estamos aqui há oito meses e nada acontece. Começo então a falar de fugir. Totó não quer saber de nada. Os outros também. Para estudar o rio, arranjei uma linha de pesca e uma isca. Assim também posso vender peixe, especialmente as famosas piranhas, peixes carnívoros que chegam a pesar 1 quilo e cujos dentes estão dispostos como os dos tubarões, e são tão terríveis como os deles ou ainda mais.

Hoje deu-se um alarma geral. Gaston Duranton, o Torto, fugiu, carregando 70 000 bolívares do cofre do diretor. Esse duro tem uma história original.

Ainda criança, achava-se no reformatório da Ilha de Oléron e trabalhava como sapateiro na oficina. Um dia, rebenta-se a correia de couro que segura o calçado sobre o joelho e passa por baixo do pé. O menino desloca o quadril. Mal tratado, o quadril solda-se pela metade e ele fica torto por toda a sua vida de menino e parte de sua vida adulta, como veremos mais adiante. Vai para a colônia penal aos 25 anos. Não é de admirar que, depois de longas temporadas em reformatórios de menores, ele tenha se transformado em experimentado ladrão.

Toda a gente o chama de Torto. Quase ninguém conhece seu verdadeiro nome, Gaston Duranton. Torto ficou, Torto é chamado. Apesar de manquitola, ele consegue escapar do presídio e chegar à Venezuela. Deu-se isto no tempo do tirano Gómez. Poucos fugitivos sobreviveram à sua repressão. Houve algumas exceções: por exemplo, o Dr. Bougrat, porque ele salvou toda a população da ilha das pérolas margarita, ameaçada por uma epidemia de febre amarela.

O Torto, detido pela “sagrada” (era o nome da polícia especial do ditador Gómez), foi mandado trabalhar nas estradas da Venezuela. Os prisioneiros franceses e venezuelanos eram mantidos acorrentados a bolas de ferro que traziam gravada a flor-de-lis das galés de Toulon. Quando os franceses se queixavam, os guardas diziam: “Mas estas correntes, estas algemas, estas bolas vêm do seu país! Vejam só a flor-de-lis!” Para encurtar, o Torto evadiu-se do campo volante onde trabalhava na abertura da estrada. Foi recapturado em alguns dias e devolvido ao presídio ambulante. Diante de todos os presos, deitam-no pelado, de bruços, e o condenam a receber cem golpes de nervo de boi.

É muito raro que um homem resista a mais de oitenta golpes. A sorte que ele tem é de ser magro, pois, deitado de bruços, as pancadas não podem lhe atingir o fígado, órgão que rebenta se for atingido diretamente. É costume, depois dessa flagelação, em que as nádegas ficam retalhadas, jogar sal sobre a carne lanhada e deixar o homem esticado ao sol. Contudo, cobrem-lhe a cabeça com uma folha de bananeira ou outra planta, pois admitem que o homem morra de pancadas, mas não de insolação.

O Torto sai vivo desse suplício digno da Idade Média e, quando se levanta pela primeira vez, verifica, muito surpreso, que não está mais torto. As pancadas quebraram-lhe a soldadura mal feita e lhe colocaram a anca exatamente no lugar. Soldados e prisioneiros gritam “Milagre!”, ninguém compreende o que aconteceu. Nesse país supersticioso, acreditam que foi Deus que o recompensou por ter resistido dignamente às torturas. A partir desse dia, tiram-lhe os ferros e a bola. Passa a ser protegido e fica encarregado da distribuição de água aos trabalhadores forçados. Ele então se desenvolve fisicamente e, comendo bastante, transforma-se num rapaz grande e atlético.

A França veio a saber que os sentenciados fugidos trabalhavam na construção de estradas na Venezuela. Pensando que essas energias seriam melhor aproveitadas na Guiana Francesa, o Marechal Franchet d’Esperey foi enviado como embaixador especial para solicitar ao ditador – muito feliz com essa mão-de-obra gratuita – a devolução desses homens à França.

Gómez aceita e, em Puerto Cabello, um navio vem buscá-los. Aí acontecem brincadeiras terríveis e de mau gosto, pois há homens que procedem de outros campos de trabalho e não conhecem a história do Torto.

– Eh! Marcel, como vai?

– Quem é você?

142
{"b":"122680","o":1}